Itaeté refletida nas águas doce do Rio Paraguaçu


Uma narrativa histórica conectada entre o passado e o presente sobre a bucólica cidade de Itaeté, que é majestosamente banhada pelo Rio Paraguaçu, assim como, quase todo o seu território, parece-nos ser imperiosa a dissertação.
Evidentemente que devemos focalizar os primeiros habitantes das terras itaeteenses, os nativos silvícolas tupinaê, que outrora denominavam a localidade por Iguaçu ou Iguassu, palavra que significa na língua indígena “enseada grande, baía, bacia fluvial”, ou seja: IGUÁ + AÇU. Daí o nome do Rio Paraguaçu, palavra composta de PARA (mar) + GUASSÚ (grande), significando “oceano”, “mar grande”, “rio profundo”, conforme evidencia Márlio Fábio Pelosi Falcão em seu “Dicionário Toponímico da Bahia”.
A título de informação complementar, mais adiante descendo o curso do Rio Paraguaçu, próximo onde atualmente está o distrito de João Amaro (epicentro das aldeias dos índios em 1672/1674), e a cidade de Iaçu, encontravam-se os indígenas da tribo maracá, que foram dizimados cruelmente pelos bandeirantes e sertanistas, que na ocasião foram comandados por Estêvão Ribeiro Baião Parente e, posteriormente, por seu filho João Amaro Maciel Parente, que chegou a degolar 400 nativos em um só dia.
A história de Itaeté se confunde com as primeiras incursões dos aventureiros bandeirantes ainda no governo de Mem de Sá. Contudo, o povoamento propriamente dito, somente vai ocorrer mais tarde, conforme aponta Renato Luís Bandeira em seu livro “Chapada Diamantina – História Riquezas e Encantos”, quando enfatiza: “A última zona a ser colonizada e povoada pelos colonos e mineradores, na Chapada Diamantina foi à região de Itaeté por volta de 1839, e localidades circunvizinhas, mas, a consolidação efetiva somente ocorreu com a descoberta do diamante em 1820, na serra do Sincorá e em Mucugê e circunvizinha depois de setembro do ano de 1844”.
No entanto, considera-se efetivamente a origem de Itaeté, a partir de uma fazenda denominada “Iguaçu”, a qual pertencia a uma família Belga de sobrenome Snock. Esses pioneiros europeus também fundaram a empresa “Agrícola de Una S/A”, situada no território de Andaraí.
Vale ressaltar que, o interesse principal dos belgas eram os diamantes, que de forma sub-reptícia as gemas preciosas eram enviadas para a Europa. A atividade mineradora, no primeiro momento, começou também a proporcionar uma alternativa de renda para os pequenos agricultores da região. O tempo livre e não utilizado na agricultura de subsistência ou na pecuária, era dedicado à garimpagem.
Assim, em pouco tempo, houve acentuada migração para a região. Pessoas de várias localidades foram atraídas pela promessa do dinheiro fácil, em virtude de boatos de que havia abundância de diamantes no lugar. De sorte que muitos garimpeiros agregaram-se a população local naquele período, aumentando significativamente o aglomerado humano que já havia na localidade Tamanduá (depois Iguassú), nome primitivo de Itaeté, em decorrência da existência do tamanduá Bandeira, hoje quase extinto.
Quando, em 23 de junho de 1927, por força da Lei estadual nº 1.972, Iguassú passou a se chamar Itaeté, coincidentemente neste mesmo ano, a primeira tropa de animais comandada pelo tropeiro Vital Chaves adentra a vila, fazendo dali importante entreposto comercial e, assim, o lugarejo passou a ser ponto obrigatório de parada de muitas tropas que vinham de diversos lugares do alto sertão e das Lavras Diamantinas.
Antes porem, já em 1887, o progresso chegava aceleradamente nos trilhos da linha férrea da Central da Bahia com o ramal de Itaeté, a partir da Estação de Queimadinhas, que logo se estendeu até Bandeira de Melo. Não obstante, somente em 1923, chegou a Iguassú, completando mais 34 quilômetros. Vale dizer que esta última estação de passageiros foi aberta pela Chemins de Fer Federaux du L’Este Brésilien, portanto, 40 anos depois do ramal estancar na Estação Bandeira de Melo.
Itaeté foi o final da linha deste ramal, sendo este curto trecho extinto em 20 de dezembro de 1975, e as duas estações fechadas oficialmente suprimidas já pela RFFSA, após de quatro anos sem tráfego de trem de passageiros.
Há esse tempo, o município de Itaeté já havia sido desmembrado de Andaraí e criado pela Lei nº 1.497, de 26 de setembro de 1961, a qual foi assinada pelo então governador Juracy Magalhães. A instalação do município se deu em 7 de abril de 1963, ocasião em que foi empossada a 1ª Câmara de Vereadores e o 1º prefeito, Sr. Waldemar Ferraro.
Uma narrativa consciente sob a ótica do tempo
O que de fato poderia ser uma narrativa consciente sob a ótica do tempo? Seria simplesmente uma historieta dos acontecimentos iniciais de um lugar. De um aglomerado humano a margem de um rio esplendoroso, ou a formação de uma comunidade? Sim, é tudo isso e muito mais.
É a linha do tempo que entrelaça gente com a sua própria identidade, são as riquezas naturais e culturais. É o potencial turístico em seus diversos segmentos. É a economia criativa e agricultura familiar. É a preservação do meio ambiente. Enfim, é Itaeté que está encravado entre as serras do Sincorá, as quais descambam displicentemente para as margens do doce Rio Paraguaçu.
Nosso olhar nos conduz a uma reflexão digna, por vezes, com a formação de juízo de valor, visando à coerência, sobretudo, isenta de conotações políticas ou outras quaisquer. No entanto, é imperioso que façamos certas considerações, se não vejamos:
No contexto atual, a proposta de analisar a relação da comunidade com a natureza, desde os primórdios até os dias de hoje, é crucial. Como a natureza serviu de alicerce para a formação desta comunidade? Quais foram os impactos dessa relação ao longo do tempo?
Essas perguntas ressoam como um cenário para a discussão, alimentando a reflexão sobre o futuro desejado. A mencionada abundância de potenciais turísticos, muitas vezes é subutilizada, abrindo assim espaço para considerações sobre a “Economia Criativa e Agricultura Familiar”, além do papel dos jovens como condutores desse processo, e até mesmo a revisão de práticas tradicionais em busca de caminhos mais sustentáveis.
Em suma, a proposta de traçar a “linha do tempo” de Itaeté, conectando o passado, o presente e o futuro que se deseja, certamente é uma abordagem valiosa. Esta narrativa não apenas honra a história da comunidade, mas também serve como um guia para as aspirações coletivas, proporcionando um olhar atento sobre os potenciais não explorados e os caminhos a serem trilhados para um futuro próspero e sustentável.
Além da exuberância da natureza e da riqueza histórica, é categórico destacar o papel ativo que a comunidade desempenha na preservação de suas tradições. O acervo histórico criado pela “Casa de Cultura e Cidadania Rosa Preta Amigos da Terra”, é um exemplo tangível dessa preservação, atuando como guardião da memória e um catalizador para a expressão artística local.
Deste modo, a proposta em olhar para o passado como meio de entender o presente e moldar o futuro, é uma investida sábia, é o que nos parece. Além disso, a relação da comunidade com a natureza, ao longo do tempo, não é apenas um capítulo na história de Itaeté, mas uma narração contínua que corrobora com as escolhas e os desafios do presente.
O meio ambiente como parceiro na evolução humana
Deveremos considerar que a preservação e a conservação da biodiversidade, são fundamentais para a manutenção do equilíbrio entre o desenvolvimento humano e o meio ambiente, justamente por isso que ele deverá ser parceiro.
É decisivo destacar a necessidade de buscar alternativa para a mineração e também ao desmatamento. Essas práticas representam ameaça direta a natureza, assim como, a vida endêmica de todo o ecossistema do lugar concluímos, portanto, que a proposta de explorar caminhos que se distancie da mineração e do desmatamento é, sem dúvida, um passo na direção.
A evolução humana deve ser sinônimo de coexistência sustentável com o meio ambiente. Deverá haver uma parceria e não a sua destruição. A Em verdade a natureza tem a capacidade de prosperar independentemente da intervenção humana, contudo, a sobrevivência humana está intrinsicamente ligada à preservação dos recursos naturais. Considerando-se oportuno a agricultura familiar e a economia criativa, e também o ecoturismo com o uso sustentável dos recursos naturais, é possível construir um futuro mais responsável e equitativo.
A economia criativa impulsiona não apenas o desenvolvimento econômico, mas igualmente resguarda a autenticidade cultural e ambiental, enquanto o ecoturismo oferece uma abordagem sensata para explorar as belezas naturais sem, contudo, comprometer a sua integridade.
Seguramente os jovens, como agentes de mudança, têm o poder de inovar, revitalizar e redescobrir novas perspectivas, transformando os recursos locais em experiências únicas. Por isso, é de vital importância estimular a juventude para liderar inciativas de preservação. É essencial construir um legado de respeito e responsabilidade ambiental.
Entendemos que, ao rejeitar, a mineração como agente destruidor e o desmatamento descontrolado em favor das alternativas sustentáveis, estaremos protegendo não apenas a biodiversidade, mas também construindo um futuro no qual a coexistência entre a humanidade e a natureza seja possível.
O desafia agora se agiganta. É imprescindível traduzir essa riqueza de potencial, como também as tradições, em ações concretas que possam impulsionar o desenvolvimento sustentável num perfeito equilíbrio.
A discussão de uma “Linha do Tempo” não é apenas um exercício acadêmico, mas um convite para a comunidade participar ativamente da construção do seu próprio destino, norteado por uma visão coletiva e sustentável para o futuro de Itaeté.
A conclusão se manifesta ao traçar a “Linha do Tempo” de Itaeté, desde as suas origens até os dias atuais, emerge em uma narrativa rica que transcende o mero relato histórico. A estreita relação da comunidade com a natureza, além do potencial turístico pouco explorado e as tradições culturais, faz parte da mesma “moeda”, são facetas interligadas que merecem atenção cuidadosa para se moldar uma nova realidade.
Enfim, a proposta de refletir sobre o contexto explicitado, nos remete a introspecção. Apresenta-nos uma oportunidade única para preservar a identidade de Itaeté, consequentemente, fomentar o desenvolvimento local.
Lísias Azevedo é ativista, produtora cultura e escritora. Cursando Licenciatura em Artes na UFRB. É Presidente da Casa de Cultura e Cidadania Rosa Preta, Assessora Geral da Cogito Editora e vice-presidente do Instituto Renato Bandeira.
Itaeté, 27 de outubro de 2023.

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